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A filial brasileira da multinacional francesa de medicamentos Sanofi se tornou, neste ano, a primeira empresa no país a receber o selo age-friendly (algo como “amigável à idade”, em inglês), criado há 17 anos pelo americano Age-Friendly Institute. A iniciativa surgiu como resposta ao envelhecimento populacional.
A ideia é ajudar os candidatos com mais de 50 anos a encontrar uma vaga de trabalho compatível com a sua experiência, sem discriminação de idade. O selo reconhece as empresas que valorizam os 50+ por conhecimento, maturidade, confiabilidade e produtividade.
Dessa forma, quem estava acostumado a trabalhar com programas de trainee é desafiado a rever seus conceitos e abrir espaço para os talentos 50+.
“Hoje, essa faixa etária corresponde a 16% do total do quadro de colaboradores da Sanofi no país”, disse Pedro Pittella, diretor de pessoas na Sanofi Brasil. “Mas estamos em busca de talentos com esse perfil e temos uma meta de contar com 20% de profissionais 50+ em nosso quadro de colaboradores até 2025”, afirmou.
O Age-Friendly Institute estabelece as melhores práticas para um “empregador amigo dos trabalhadores maduros”. No Brasil, o instituto é representado pela Maturi, uma startup de inclusão de pessoas com mais de 50 anos no mercado de trabalho.
“Trouxemos essa certificação para o país no começo deste ano. Temos cinco empresas com o selo até agora e outras quatro em processo de certificação”, disse Mórris Litvak, fundador e presidente da Maturi.
Destas cinco, três são farmacêuticas —além da Sanofi, a Takeda e a Eurofarma— e duas são varejistas —o Grupo Pereira (dono das redes Comper e Fort Atacadista, entre outras) e Grupo São Vicente, do interior paulista.
De acordo com Litvak, a certificação observa 12 categorias, desde o percentual de colaboradores 50+ até o nível de integração com funcionários mais jovens, passando pela preparação para a aposentadoria ou pós-carreira.
“A certificação vai, naturalmente, ajudar a empresa a entender e atender melhor o seu consumidor com mais de 50 anos”, disse o executivo.
A Maturi decidiu trabalhar com o público 50+ —não 60+, de idosos— porque percebeu que, a partir da meia centena de vida, os profissionais já ficam praticamente invisíveis para o mercado de trabalho.
“Principalmente para as mulheres, a partir dos 50, o mercado de trabalho já se torna bastante desafiador”, disse Litvak. “Nosso objetivo sempre foi trabalhar com pessoas que estavam sofrendo o etarismo profissional, a dificuldade em se inserir no mercado de trabalho por causa da idade.”
De acordo com o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), o percentual de idosos no mercado de trabalho avançou nas duas últimas décadas. Em 2000, 4,3% dos idosos faziam parte da população economicamente ativa. Hoje são 6,8%.
Para aqueles profissionais com mais de 50 que já tiveram uma trajetória de sucesso no mercado corporativo, mas estão desempregados, a agência Talento Sênior criou uma solução chamada “talent as a service”.
“A ideia é oferecer aquele talento que a sociedade não está mais usufruindo, que já foi de grandes empresas, e apresentá-lo de forma fracionada a pequenas e médias operações”, disse Juliana Ramalho, presidente da Talento Sênior. O “fracionado” é porque o profissional não é exclusivo de uma empresa.
“Ele pode ser o CFO, o diretor de RH, o presidente de três empresas ao mesmo tempo, não de uma só”, disse. “É um modelo acessível para a pequena e média empresa, que não pode pagar alguém tão experiente em tempo integral, ao mesmo tempo em que dá oportunidades de trabalho a quem estava parado”, afirmou Juliana, especialista em longevidade pela FGV (Fundação Getulio Vargas).
A executiva dá o exemplo de um dos candidatos, Antonio Abbade, 59. Engenheiro mecânico formado pela USP (Universidade de São Paulo), com MBAs em administração e negócios pela FGV, e em finanças pela FIA Business School, Abbade se especializou na área de finanças ao longo da carreira.
“Quando o encontramos, no final de 2021, ele estava desempregado há um ano e meio. Nós o colocamos em quatro empresas: cada dia da semana ia em uma, sendo que uma das empresas o contratou por dois dias”, disse Juliana. “Hoje a renda dele já voltou perto dos R$ 20 mil mensais.”
A Talento Sênior começou em outubro de 2021 e hoje conta com 1.200 profissionais cadastrados na sua plataforma. “Queremos recolocar no mercado o pessoal mais velho, que foi muito afetado pelos cortes na pandemia”, disse. As áreas que mais demandam os seniores são financeiro, recursos humanos e comercial.
Já o coletivo Trabalho 60+ foi criado em fevereiro de 2017, com a proposta de praticar, incentivar e propagar ações cidadãs para a valorização do idoso. “Nós somos um coletivo aberto, inclusivo, em busca de trabalho colaborativo, prazeroso e com remuneração justa”, disse Ary Filler, 65, coordenador do coletivo.
O grupo, que congrega pessoas interessadas em trocar ideias e colaborar em diversos projetos que envolvem os mais velhos, se reúne uma vez por semana, em São Paulo. Integrantes de outras cidades participam remotamente.
“Defendemos que o protagonismo é a chave para que o idoso seja respeitado”, disse Filler. “Ele deve assumir as rédeas da própria vida e não se deixar encaminhar aos aposentos, que é o lugar que a sociedade reserva aos aposentados. Não deve se isolar ou se deprimir.”
Nesse sentido, disse, a interação social é a fundamental. “É preciso que o idoso tenha um grupo de apoio —pode ser a própria família, os amigos ou uma instituição religiosa”, afirmou.
Ao mesmo tempo, o público que lida com o time dos 60+ deve ter em mente que cada idoso é único, tem a sua própria trajetória, traz a sua experiência de vida.
“Não dá para generalizar”, disse Filler. “Até porque cada fase da velhice tem um perfil diferente —aos 60, 70, 80 ou 90 anos”, afirmou.
Uma mudança na classificação dos idosos pelo IBGE está em sintonia com essa abordagem da terceira idade, cada vez mais longeva. Até os anos 1980, a classificação etária para idosos ia até os 80+. A partir dos anos 1990, essa classificação se transformou em quatro novas faixas: 80-84 anos, 85-89 anos, 90-94 anos e 95-99 anos.
“Trabalho com idosos, que podem ou não ter demência. A pior coisa para eles é serem ignorados”, disse Paulo Bertolucci, neurologista, professor titular de Neurologia da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo), ele próprio um idoso de 68 anos. “É uma faixa etária que está aumentando neste país, todos terão que conviver cada vez mais com eles. É fundamental aprender boas regras de convivência.”
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