Dinheiro? Para que dinheiro? – O Globo

27 de julho de 2023

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Todo mundo tem o direito de fazer o que quiser com seu dinheiro, desde que tenha sido ganho honestamente. Mas, nos últimos tempos, tem aumentado o número de pessoas querendo gastar dinheiro com coisas exclusivas. Algumas originais e interessantes. Outras exageradas e descabidas.

Tempos atrás, um amigo meu fez 25 anos de casado com a mulher que também é a mãe de seus filhos, sócia no seu escritório de advocacia e sua primeira e única namorada. Para comemorar a data, convidou-a para ir ao mesmo cinema onde os dois foram juntos pela primeira vez, quando eram pós-adolescentes. Só que, para gerar uma surpresa, meu amigo comprou todos os ingressos do cinema daquele dia e colocou ao lado dos assentos que escolheu uma bandeja com duas taças e uma garrafa de champanhe dentro de um balde de gelo.

Claro que ela ficou encantada. E aquele programa exclusivo virou mais um momento inesquecível na vida daquele casal. Foi uma noite única, em que a grandeza da ideia brilhou mais que o dinheiro investido. Do jeito que a vida devia ser sempre, mas nem sempre é.
Nos dias de hoje, existem programas exclusivos para todos os gostos, mas a maioria deles para pouquíssimos bolsos. Na Itália, numa pequena cidade a 70 quilômetros ao norte de Roma, está o restaurante Solo Per Due, que se vende como o menor e mais romântico do mundo. Os jantares no Solo Per Due, como o próprio nome diz, são para um máximo de dois, devem ser reservados com meses de antecedência e custam € 500 por pessoa. Nesse preço não estão incluídos os coquetéis, champanhes e os vinhos, nem a limusine que transporta os felizardos. Música ao vivo e queima de fogos também são cobradas à parte.
Falei do Solo Per Due, um ambiente de pratos e criaturas perfumadas, mas existem programas exclusivos também para quem prefere atletas transpirados. Como os jogos de basquete da NBA, de hóquei no gelo da NHL e de futebol da Premier League. Em Nova York, por US$ 10 mil per capita, dá para assistir a um jogo dos Knicks, sentado pertinho do Spike Lee. Na mesma Nova York, e também por uns US$ 10 mil por cabeça, dá para acompanhar, de um assento coladinho na quadra, o time de hóquei do New York Rangers, jogando no Madison Square Garden. E em Londres, por alguns milhares de libras — moeda que vale mais que o dólar — dá para comprar um ano de Premier League do Chelsea, com direito ao mesmo lugar no estádio em todos os jogos e almoços regados a bons vinhos, antes das partidas.
A verdade é que, neste mundo que mudou do milhão para o bilhão, exclusividade deixou de ser exceção, para virar mercado. Há menos de 40 anos, as pessoas se espantaram com o preço da Bugatti Royale Kellner Coupe 1931, que, quando revendida em 1987, se transformou no automóvel mais caro de todos os tempos. Hoje carros de preços inacreditáveis como o Rolls-Royce Boat Tail, a Bugatti La Voiture Noire, o Rolls-Royce Sweptail, a Bugatti Centodieci e o SP Automotive Chaos são vendidos com frequência. Apesar de serem máquinas absurdamente caras e exclusivas, elas têm seu mercado.
Tem quem compre.
Assim como tem quem alugue a casa de praia do Mick Jagger em Mustique, nas Ilhas Granadinas, no Caribe. Jagger usa sua casa com frequência, mas, quando não a utiliza, aluga para mantê-la funcionando.
Nesse novo mundo repleto de exclusividades e cada vez mais cheio de gente e de contrastes sociais, existem cartões de crédito como o Dubai First Royale Mastercard e o American Express Centurion Card, que simplesmente não têm nenhum limite de crédito. São cartões de crédito para quem não precisa de cartões de crédito.
Assim como existem empresários como Richard Branson, Elon Musk e Jeff Bezos, que vendem viagens espaciais a outros bilionários como eles. Também tem quem compre.
Como eu disse no início, cada um faz o que quer com seu dinheiro. Mas, sinceramente, acho que ninguém tem o direito de fazer o que fizeram alguns desavisados quando resolveram torrar dinheiro alugando um submarino para ver os destroços do azarado Titanic. Essa atitude exibicionista e cretina, que misturou esnobismo com curiosidade mórbida, feriu a sensibilidade de muita gente.
Foi um crime. Com castigo.

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