Por Beatriz Pacheco, Valor Investe — São Paulo
Que capítulo terrível para as varejistas. Nos papéis tradicionais do mercado brasileiro, nomeadamente: Magazine Luiza, Grupo Casas Bahia (que até setembro passado se chamava Via) e Americanas, o tombo foi doído. No caso mais emblemático, o da rede carioca que está atualmente em recuperação judicial, o preço da ação caiu mais de 93% nos últimos 12 meses.
Embora as situações para essas companhias de varejo sejam bem distintas, consolidou-se no último ano uma tendência de perdas para o setor na bolsa. Mas isso se estenderá para 2024 ou teria o varejo enfim batido no fundo do poço?
Para os analistas ouvidos pelo Valor Investe, o pior parece ter ficado para trás. O que não significa que é hora de aproveitar os preços descontados nos papéis.
É bem o contrário disso, na verdade: a saída desse poço ainda parece distante para as varejistas tradicionais, que devem trilhar um caminho tortuoso neste ano.
“O macroeconômico jogará favoravelmente ao setor em 2024, pela expectativa de inflação mais baixa e menos juros, que melhorariam o quadro de endividamento dessas empresas”, disse Fernando Ferrer, analista da Empiricus Research. “Mas as varejistas tradicionais ainda estão muito estocadas e com problemas de caixa, então eu não me animo com esses papéis. Uma melhora de cenário não significa um céu de brigadeiro adiante. O ano dessas companhias será marcado pelo enfrentamento dos problemas internos.”
O especialista explica que o 2023 das varejistas foi ruim porque as operações estão muito endividadas e estocadas. As brasileiras viabilizam seus e-commerces principalmente pelo modelo 1P (do inglês, first-party relationship), que é quando a empresa tem estoque próprio para venda on-line e direta ao consumidor final.
Esse formato representou 43% do faturamento de Magazine Luiza no terceiro trimestre do ano passado, e 29% do montante transacionado pelo Grupo Casas Bahia no mesmo período.
Para operar o modelo 1P, uma grande varejista depende, além de um estoque considerável, de malha logística ampla e eficaz – estruturas que demandam investimentos elevados.
Mas quando o consumo cai – como aconteceu nos últimos três anos – , o custo de manter essa base operacional sobe, porque aí surge o problema de estoque parado. A equação se desequilibra mais ainda se o tíquete médio (o valor médio por compra) despenca nessas plataformas, como também foi o caso de 2021 para cá.
Com gastos altos e ganhos baixos, as margens dessas companhias seguem pressionadas. “O segmento de e-commerce exige um investimento elevado em tecnologia para fidelizar o cliente e ter um negócio eficiente. Por outro lado, tem margens baixas, o que impõe a diluição do estoque. Ou seja: para ganhar, é preciso vender muito”, concluiu o analista da Empiricus.
Desistiu de investir no varejo? Calma lá. Com ações tão descontadas, algumas oportunidades de investimentos surgem nesse setor, e as empresas mais bem posicionadas podem despontar na bolsa neste ciclo de queda de juros.
De acordo com os especialistas, nomes em alguns segmentos de varejo, como o de alimentos e o de alta renda, devem ganhar destaque como opções para se expor à bolsa neste ano.
É questão de saber separar “o joio do trigo”, entendendo que tipo de risco se corre e quanto é possível ganhar (ou perder) em cada caso.
Grupo Casas Bahia: mais uma recuperação judicial a caminho?
Um caso crítico entre as varejistas hoje é o do Grupo Casas Bahia. “Neste momento, não acreditamos em recuperação judicial, mas a empresa está correndo contra o tempo”, alertou Lucas Lima, analista da VG Research.
A Levante Corp também é adepta da tese de que é melhor seguir fora do papel. “A Casas Bahia passou por várias reestruturações nos últimos anos. Mas a de agora levou a companhia a fazer vários ‘saldões’ para ajustar os estoques, o que impactou a rentabilidade”, disse Caroline Sanchez, analista da casa.
A varejista atravessa processos de reestruturação desde 2014. “Já são nove anos, e quatro ou cinco trocas de CEO nesse período, mas a empresa não conseguiu fazer a virada definitiva”, avaliou Ferrer, da Empiricus. “A nova equipe executiva é competente, mas a Casas Bahia ainda necessita levantar capital, ou seja: precisará passar por uma nova oferta de ações num cenário em que os investidores ainda estão céticos com o negócio.”
Para criar um “colchão” de caixa, em meados de setembro, a varejista promoveu uma oferta subsequente de ações (follow-on). O período coincidiu com o rebaixamento da nota de risco de crédito da empresa, que já não vinha apresentando bons resultados, por isso o desfecho desse episódio foi frustrante.
O grupo esperava captar em torno de R$ 1 bilhão com a oferta, mas embolsou R$ 620 milhões. A ação, que naquela data era negociada a R$ 1,11, foi avaliada pelo mercado em R$ 0,80.
Desde então, foi só ladeira abaixo e de fato alcançou os R$ 0,80 que investidores entenderam que o papel valia. Mas desceu além. A ação bateu R$ 0,50 na véspera do seu grupamento de ações na proporção de 25 para 1, que aconteceu em 15 de dezembro.
A decisão pelo grupamento foi tomada para que o ativo permanecesse na carteira do Ibovespa, o que não seria possível se continuasse negociado abaixo de R$ 1.
Ontem, 11 de janeiro, a ação do Grupo Casas Bahia fechou o pregão cotada a R$ 9,90. Mas em valores ajustados à estrutura anterior, seu preço rondaria hoje os R$ 0,39.
“A nova gestão da Casas Bahia, comandada pelo executivo Renato Franklin, é competente e possui um plano com alavancas claras e bem quantificadas para tornar o modelo de negócio mais sustentável. Mas não será nada fácil, principalmente pelos desafios macroeconômicos e pelo acirramento da competição no mercado”, ponderou Lima, da VG.
O tom das quatro casas de investimentos ouvidas pelo Valor Investe é o mesmo: não é hora de entrar no papel. Há muito risco em jogo, já que o futuro da companhia segue incerto.
Na plataforma Valor Empresas 360, de seis analistas que (ainda) cobrem o papel, apenas um indica compra. Quatro têm recomendação neutra, um de venda e um tem o ativo sob revisão.
O preço-alvo para o ativo estava em R$ 7,98, que representa ainda um potencial de queda de quase 19,4% contra o fechamento de ontem.
Magazine Luiza: sinal amarelo
O cenário para Magazine Luiza é mais positivo que o para Casas Bahia, mas com alguns pontos de atenção em 2024. “Ainda há uma preocupação em relação à perda de participação no mercado, porque grandes concorrentes (Mercado Livre e Amazon) vêm ganhando espaço no Brasil. Por outro lado, temos como alento o último resultado reportado pela companhia, que foi positivo”, avaliou Rafael Schmidt, operador de renda variável da One Investimentos.
Magazine Luiza tem uma situação de caixa favorável: encerrou o terceiro trimestre do ano passado com R$ 8,1 bilhões de caixa total [entre investimentos, créditos e ativos imobiliários], sendo R$ 700 milhões de caixa líquido [que estão à disposição para resgate imediato]. O montante é suficiente, segundo analistas consultados, para a varejista não precisar levantar recursos no mercado neste momento.
Segundo Ferrer, da Empiricus, o impacto sobre a companhia atualmente “é mais macro do que o micro”.
Isso significa que o ambiente econômico tem potencial de afetar mais a visão do mercado para o papel do que há dúvidas entre investidores sobre a capacidade de o negócio se reerguer.
Levante e VG Research também enxergam Magazine Luiza mais bem posicionada que Casas Bahia e Americanas para capturar rentabilidade e melhorar suas margens nos próximos períodos. “A questão para a empresa é elevar o nível de serviço e retomar um fluxo positivo nas lojas físicas”, concluiu Ferrer.
Dos 10 analistas que cobrem Magazine Luiza, três indicam compra, enquanto os outros sete têm recomendação neutra. O potencial de valorização do papel até os R$ 4,27 que o mercado vê hoje como preço-justo para a ação é de 96%, considerado o preço do fechamento da bolsa na última quinta.
“Na pandemia, Magazine Luiza passou a ser avaliada como uma empresa de tecnologia, por isso, os múltiplos dela eram muito mais ‘salgados’ que os do setor de varejo”, lembrou o analista da Empiricus.
Os preços que investidores estavam dispostos a pagar por ativos ligados à tecnologia na época chamada de “juro zero” no Brasil (entre 2020 e 2021, quando a taxa de juro real estava zerada) eram bem elevados. Mas, com a escalada da Selic dos 2% ao ano até 13,75% ao ano em 19 meses, o valor de mercado dessas empresas derreteu.
A Levante entende que os múltiplos de Magazine Luiza ainda são altos. Mas, para Caroline, isso não são resquícios desse passado não tão distante, e sim indícios de que os preços dos papéis já embutiram, em grande parte, as expectativas do mercado por uma melhora da companhia.
Americanas: dá para piorar?
O caso Americanas marcou a história do mercado brasileiro no século 21 e foi um divisor de águas para o varejo. Em se tratando de movimentos de mercado e de bolsa, no primeiro momento, lembra Schmidt, da One Investimentos, investidores apostaram no crescimento de Magazine Luiza e de Casas Bahia sobre a brecha deixada pela rede carioca.
Não foi assim que a história se desenrolou. As varejistas brasileiras seguiram com dificuldades de crescimento, enquanto as já fortalecidas plataformas de fora cresceram na preferência de consumidores e lojistas daqui.
“Mercado Livre ganhou 20 pontos de participação de mercado nos últimos três anos e entra em 2024 bastante fortalecida frente a essas concorrentes”, disse Ferrer, da Empiricus.
Em um cenário altamente disputado, com rivais como Mercado Livre e Amazon, que são listadas nas bolsas dos Estados Unidos e captam recursos em dólar, a Americanas ainda depende do bom andamento do seu recém-aprovado plano de recuperação judicial para minimamente manter suas operações.
Mas dá para piorar? Dá, sim. Embora esse horizonte esteja mais bem desenhado para a companhia daqui para frente, a varejista precisa cumprir todas as cláusulas firmadas no acordo com credores. Do contrário, ainda pode ser arrastada para a falência.
“A Americanas precisa passar por uma reciclagem completa do portfólio. Desde o início da crise, tenho defendido que seria mais interessante se a varejista se tornasse uma operação regional”, declarou o analista da Empiricus.
A Americanas tinha, em 31 de novembro do ano passado, 1.759 lojas pelo Brasil e trabalhava com um prazo médio para pagamento de seus fornecedores de cinco dias (contra 122 dias em dezembro de 2022, antes do escândalo contábil estourar). Já o prazo de recebimento dos clientes estava em 40 dias no fim de novembro.
Os investimentos em infraestrutura operacional enxugaram 90% nos primeiros 11 meses de 2023, de R$ 177,4 milhões em dezembro passado para R$ 17,3 milhões em novembro último.
“Isso é muito ruim em um segmento que exige grandes investimentos para fornecer um nível de serviço adequado. Somado a um prazo de pagamento apertado, que compromete o capital de giro, a situação é bem dramática”, declarou Ferrer. “Estruturalmente, acredito que a Americanas jamais voltará a ser o que era antes da crise em termos de participação no mercado. Mas, para uma recuperação bem-sucedida, a companhia precisa enxugar, seja se desfazendo das joint ventures, pela venda de ativos não essenciais ou pela redução do parque de lojas.”
As apostas em outros segmentos do varejo
Varejo alimentar: deu zebra
O varejo alimentar viveu uma disputa por muitos anos dominada pelas redes supermercadistas, mas que desde a pandemia tem um claro vencedor, até então fora do radar de investidores: os atacarejos.
Até cinco anos atrás, o atacarejo era visto como modelo de nicho B2B (vendas para empresas) e segmentado em clientes de classes C e D, hoje é a principal opção de compras em volume entre os consumidores de alta renda.
Nesse âmbito, Assaí se destaca como a ação mais recomendada entre casas de análises atualmente. De nove analistas que cobrem o papel, oito recomendam a compra. Não há situação semelhante neste segmento.
Uma combinação de fatores relacionados a ambiente macroeconômico, crises nos concorrentes e estratégia de negócios bem-sucedida alçou o Assaí à posição de “queridinho” do varejo alimentar.
“Assaí terminou o projeto de conversão das lojas e se aproxima do ponto de inflexão que levaria ao ramp-up [escalada de resultados das vendas] em lojas”, disse Caroline, da Levante. Ela lembra que a companhia fez sinalizações positivas sobre vendas no quarto trimestre (ainda a ser reportado) e de reacomodação ao cenário de deflação alimentar.
A Empiricus tem o Assaí como “top pick” no segmento, pelo projeto de negócio bem implementado e por ser uma operação de alcance nacional e focada exclusivamente em atacarejo – diferentemente de Carrefour, que também opera no varejo, e de Grupo Mateus, que está concentrado em duas regiões do país.
Por terem "um pé" no atacarejo, Carrefour e Grupo Mateus também podem reportar boas performances na recuperação das margens em 2024.
"Esse modelo foi o grande destaque em termos de crescimento. Mas esperamos resultados mistos para Carrefour em 2024. Por um lado, há perspectiva de captura de sinergias da integração com Grupo BIG e conversão de hipermercados em lojas do Atacadão. Por outro, esperamos números ainda pressionados pela deflação alimentar e pela competição acirrada nesse segmento", avaliou Lima, da VG.
Já o Grupo Mateus tem se destacado para a Levante pelo "melhor resultado do segmento e dominância da operação nas regiões Norte e Nordeste". A companhia tem um plano de expansão focado na inauguração de lojas, projeções de margens acima das estimativas do último trimestre e foco em melhorar a rentabilidade de lojas.
GPA, do Pão de Açúcar, é a ação preterida pelo mercado, que faz uma leitura de riscos para a companhia semelhante à que tem para Casas Bahia atualmente.
“É uma empresa que também vem passando por uma grande reestruturação, e até vemos a possibilidade do Casino deixar a empresa como ponto positivo, considerando que hoje grande parte do conselho do GPA é do controlador francês”, disse a analista da Levante. “Mas isso também depende de que essa operação consiga se sustentar. A cautela vem desse processo e do entendimento que esses resultados não aparecerão da noite para o dia, mas a maior parte desses riscos já está embutida no preço do ativo hoje.
Varejo de alta renda: os intocáveis
Os papéis do varejo de alta renda são os favoritos do mercado para se expor ao setor. Foram esses os ativos que mais resistiram às mudanças em carteiras de ações nos últimos anos.
“Nossa visão segue bastante positiva com o varejo de alta renda para 2024, uma vez que a demanda desse público é pouco elástica e mais resiliente às variações dos principais indicadores macroeconômicos”, disse Lima, da VG. “São empresas com resultados sólidos mesmo em cenários desafiadores e que devem seguir com bons números.”
Para a VG, Vivara é um destaque pelos “ótimos números operacionais e financeiros”. A One Investimentos também cita a empresa de joias, que aumentou seu valor de mercado em 65% em 2023. Há recomendação de compra para o papel entre todos os sete analistas que cobrem a companhia.
Arezzo é outra que aparece entre as principais escolhas do mercado, citada pela Levante (que também indica Vivara) pela perspectiva de crescimento de dois dígitos e despesas menores nos próximos trimestres.
A Empiricus, por fim, traz outro nome à roda: Grupo SBF, dona da Nike Brasil e da Centauro. Segundo Ferrer, a empresa tende a se beneficiar mais que seus pares da queda da Selic e ainda está barata. Pelo preço-justo médio do mercado para o ativo, a ação tem potencial de alta de 40,7%, conforme dados reunidos na plataforma Valor Empresas 360. De sete analistas que cobrem o papel, seis recomendam a compra.
Varejo de vestuário: o inimigo agora é outro
Analistas divergem sobre o futuro do varejo de vestuário em 2024. Mas mesmo os otimistas se curvam ao principal ponto de cautela para este segmento: o avanço da Shein no mercado brasileiro.
Schmidt, da One Investimentos, tem perspectivas negativas para todas as empresas de consumo cíclico, o que inclui o varejo de roupas e calçados. A Empiricus Research também não tem recomendação de compra para nenhuma dessas ações atualmente.
VG Research e Levante são do outro time, o dos que enxergam o copo d’água meio cheio.
“Acreditamos em resultados gradualmente melhores nos próximos trimestres, porque é um segmento que depende menos do crédito (tem tíquetes de compra menores), então tende a responder mais rápido à melhora do cenário macroeconômico", disse Lima.
Mas a VG faz ressalvas às empresas desse segmento que possuem braço financeiro no modelo de negócio, “uma vez que o nível de inadimplência vem atrapalhando bastante o resultado consolidado.”
A VG destaca C&A entre as ações desse portfólio, pelo crescimento das vendas acima de “pares de qualidade” como a Lojas Renner, que é a favorita da Levante.
“A Lojas Renner tem implementado tecnologias que devem começar a trazer margens melhores daqui para frente. Com essas mudanças, a empresa conseguirá produzir coleções ao longo das temporadas, o que deve minimizar bastante o risco de ter produtos incorretos, como aconteceu neste ano em que praticamente não houve inverno”, disse Caroline. “A empresa também está com múltiplos descontados e talvez mudanças em relação à taxação das plataformas asiáticas sejam um ponto benéfico para a empresa.”
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